Editores da série MOC: Antonio Carlos Buzaid - Fernando Cotait Maluf - Carlos H. Barrios

Editor-convidado: Caio Max S. Rocha Lima

Próstata

Prostatectomia Radical ou Watchful Waiting no Câncer de Próstata localizado?

A prostatectomia radical está associada à menor mortalidade por câncer de próstata quando comparada com watchful waiting; foi essa a conclusão a que chegou um longo estudo com até 23,2 anos de seguimento (mediana de 13 anos), realizado pelo Scandinavian Prostate Cancer Group Study e publicado recentemente no New England Journal of Medicine.

Entre 1989 e 1999, 695 homens com câncer de próstata (estádio precoce) foram randomizados para prostatectomia radical ou watchful waiting, para então serem acompanhados até o final de 2012. Os desfechos primários foram: morte por qualquer causa, morte por câncer de próstata e risco de metástases. Já o desfecho secundário foi a necessidade de bloqueio hormonal.

A incidência cumulativa de mortalidade específica por câncer de próstata após 18 anos foi menor no grupo submetido à cirurgia, em relação ao grupo observação (18% versus 29%). A redução foi significativa apenas para homens com < de 65 anos.

Os pesquisadores constataram que, durante 23,2 anos de acompanhamento, 200 dos 347 homens do grupo cirurgia e 247 dos 348 homens do grupo de vigilância foram a óbito. Em relação às mortes por câncer de próstata, 63 pacientes pertenciam ao grupo cirurgia e 99, ao grupo watchful waiting, risco relativo de 0,56 (IC de 95%; 0,41-0,77; p=0,001).

Nesta atualização, o número de casos necessários para serem tratados e prevenirem uma morte caiu de 20 para 8, em pacientes com 18 anos de seguimento, quando comparados aos da publicação anterior, com 10 anos de seguimento. Além disso, caiu de 8 para 4 para homens com < 65 anos de idade.

O bloqueio hormonal foi menos utilizado nos pacientes que se submeteram à cirurgia (diferença de 25%; IC de 95%; 17,7-32,3). Seu benefício em reduzir a mortalidade por câncer de próstata foi maior em homens com < 65 anos de idade (RR de 0,45). Já em homens mais velhos com câncer de próstata, risco intermediário (RR 0,38), a prostatectomia radical foi associada ao menor risco de metástases (RR de 0,68).

Em relação à morbidade, os grupos apresentaram taxas semelhantes de disfunção erétil (aproximadamente 80%), porém, o grupo submetido à cirurgia teve uma maior incidência de incontinência urinária em comparação ao grupo watchful waiting (41% versus 11%).

O trabalho concluiu que o follow-up prolongado confirmou redução significativa na mortalidade global e câncer específico, após a prostatectomia radical, em homens com < 65 anos e com doença inicial.

Este histórico estudo randomizado de pacientes recrutados entre 1989 e 1999 (a maioria na era pré-PSA) revela que o follow-up prolongado confirmou redução significativa na mortalidade global e câncer específico após a prostatectomia radical em homens com < 65 anos e com doença inicial. Já para os pacientes com > 65 anos, não houve benefício da prostatectomia radical na mortalidade global e mortalidade câncer específica, o que reforça a possibilidade de vigilância ativa para este grupo.

Outro dado importante é que uma parcela significativa dos sobreviventes de longo prazo do grupo não operado nunca precisou de qualquer tratamento.

Embora tenham sido incluídos somente aqueles que na época eram considerados de risco baixo ou intermediário, a partir de 1987, a média de PSA sérico passou para 13,5 e foram admitidos pacientes com até 50 de PSA. Isto significa que, pela estratificação atual de risco, pelo menos a metade dos pacientes seria de risco intermediário e alto. Ademais, um número pequeno, porém não desprezível, de pacientes do grupo operado apresentou linfonodos acometidos, mesmo pela insuficiente amostragem da linfadenectomia obturatória.

De várias formas, estes dados não excluem a prática de vigilância ativa aos pacientes de baixo ou muito baixo risco, como atualmente definidos de forma mais precisa, pois hoje são considerados o estádio clínico, o PSA e os achados patológicos da doença, mesmo para os pacientes com < 65 anos. Vários centros também utilizam a ressonância magnética multiparamétrica na avaliação de risco. Atualmente, os pacientes são diagnosticados em estádios muito mais precoces da doença, e as estratégias de vigilância ativa são mais seguras que o watchful waiting para os tumores de baixo ou muito baixo risco. É lamentável que o trabalho randomizado, comparando a prostatectomia radical com a vigilância ativa, não tenha conseguido bom recrutamento de pacientes.

O avanço no tratamento do câncer de próstata localizado requer melhor identificação dos tumores potencialmente letais. Neste estudo, talvez, a caracterização molecular dos pacientes com evolução adversa, mesmo após o tratamento curativo, bem como dos com seguimento favorável, sem nenhum tratamento, poderá ser muito relevante para novas formas mais eficientes de estratificação de risco para o manejo adequado de cada paciente com câncer de próstata localizado.

Agradecemos em especial ao Dr. Alvaro Sarkis pela valiosa colaboração com seus comentários.

Referência:
Bill-Axelson A, Holmberg L, Garmo H, et al. Radical Prostatectomy or Watchful Waiting in Early Prostate Cancer. N Engl J Med 370:932-942, 2014.

Alvaro Sadek Sarkis
Livre Docente pela Universidade de São Paulo, Urologista do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes – Beneficência Portuguesa de São Paulo.

Antonio Carlos Buzaid
Chefe Geral do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes – Beneficência Portuguesa de São Paulo.

Raphael Brandão Moreira
Médico Residente de Oncologia Clínica do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes – Beneficência Portuguesa de São Paulo.

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